Informativo Eletrônico - Edição 212 - Outubro / 2024

A RESOLUÇÃO 209/2024 DA ANA E OS PRIMEIROS PASSOS À MEDIAÇÃO REGULATÓRIA NO SETOR DE SANEAMENTO

Ana Paula Sovierzoski

1. Introdução

A partir da Lei 14.026/2020, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) recebeu a atribuição de disponibilizar, “em caráter voluntuário e com sujeição à concordância entre as partes, ação mediadora ou arbitral nos conflitos que envolvam titulares, agências reguladoras ou prestadores de serviços públicos de saneamento básico” (art. 4º-A, § 5º).

Assim, a Agenda Regulatória da ANA 2022-2024, que auxilia na identificação de problemas que necessitam da atuação da Agência, definiu, no Eixo Temático nº 9, item 9.17, a meta de estabelecer procedimentos para mediação e arbitragem.¹

2. Identificação do problema regulatório

Por meio da Nota Técnica 3/2023/COGER/SSB, a ANA verificou o problema regulatório a ser enfretado relacionado ao “aumento do custo de transação dos atores do setor de saneamento básico, em decorrência da judicialização, causando prejuízos à sociedade”.²

A fim de que fosse viabilizada a solução de divergências na interpretação das normas de referência da Agência visando à minimização dos custos e tempo envolvido para as partes, a minuta base de Norma de Procedimentos para a Ação Mediadora e Arbitral da ANA foi submetida à Consulta Pública 011/2023,³ que veio a se tornar, com muitas alterações, a Resolução 209/2024 da ANA.

3. As disposições da Resolução e o procedimento da mediação regulatória na ANA

Neste contexto, em 11.09.2024, a ANA editou a Resolução 209/2024, que entrou em vigor em 18.09.2024 (art. 36). A referida resolução estabelece o procedimento administrativo para condução e concretização de mediação regulatória no âmbito do saneamento básico, no que concerne às controvérsias acerca da interpretação e aplicação de suas normas de referencia (art. 1).

O procedimento deve ser conduzido pelos princípios da imparcialidade do mediador, isonomia entre as partes, busca do consenso, eficiência e, especialmente, a confidencialidade (art. 3º). 

O requerimento da mediação deve ser formalizado diretamente à ANA (art. 7º), por meio do preenchimento de formulário específico a ser disponibilizado (art. 4º), podendo ser apresentado unilateralmente ou em conjunto pelas partes envolvidas (art. 2º). A mediação só será instaurada com a concordância expressa de todos os envolvidos (arts. 2º). 

Na sequência, ao realizar o juízo de admissibilidade, a ANA deverá avaliar a sua competência legal, a pertinência do tema com o saneamento básico, a viabilidade de solução por mediação e, ainda, a relevância socioambiental e/ou econômica da controvérsia (art. 11, I a IV).

Uma vez admitida a mediação, a despeito do princípio da autonomia da vontade das partes (art. 3º, IV), a ANA desginará um mediador (art. 16). Os mediandos poderão impugná-lo, desde que de forma fundamentada, em até 5 dias da ciência de sua desginação ou do fato gerador de sua incompatibilidade (art. 17). Ainda, a critério da ANA, poderão ser admitidos comediadores (art. 20).

A partir da decisão de admissibilidade, o procedimento será desenvolvido por até 120 dias corridos (art. 21), prorrogável uma única vez por 40 dias na estrita eventualidade do acordo estar em finalização da redação final (art. 21, § 1º).

As reuniões de mediação devem ocorrer prefencialmente de forma virtual (art. 24) e o mediador poderá realizar reuniões individuais com os mediandos (art. 26), desde que ofertadas as ambas as partes. 

Concluídos os trabalhos, será formalizado o termo final de mediação regulatória, que poderá indicar a celebração do consenso (total ou parcial) entre os mediandos ou a sua inviabilidade (art. 28). Na eventualidade da solução consensual do conflito, deverá descrever a solução adotada que constituirá titulo executivo extrajudicial (art. 30). 

Em prol da confidencialidade do procedimento, até a lavratura do termo final, havendo ou não a consensualidade, este será restrito aos mediandos, ao mediador e às áreas da ANA competentes para atuação (art. 33).

4. Breves considerações

Estabelecidas as diretrizes básicas referentes à estruturação do procedimento de mediação regulatória por meio da Resolução 209/2024 da ANA, o art. 32 dispõe que serão objeto de regulamentação os “procedimentos internos, prazos, custas processuais e competência para a prática dos atos administrativos de responsabilidade da ANA”. 

Portanto, embora a referida Resolução represente um grande avanço no setor de saneamento em direção ao consensualismo, verifica-se que apenas garante os primerios passos em direção à efetiva autocomposição das partes em questões potencialmente litigiosas, dependendo de regulamentação específica para ser efetivamente concretizada enquanto prática regulatória da ANA.

5. Conclusão

Diante de um extenso histórico de judicialização e litígios, é inegável que o Brasil tem, cada vez mais, reconhecido e valorizado a importância da consensualidade para a prevenção e resolução de conflitos de maneira mais célere, prezando pela eficiência.

A ANA, como agência reguladora, reconhecendo os desafios regulatórios do setor de saneamento, deu um importante passo ao institucionalizar a mediação regulatória em suas práticas, mesmo que sua implementação esteja em caráter inicial em prol da cooperação entre os titulares, as agências reguladoras e os prestadores de serviços públicos de saneamento básico. 

Ao assegurar a correta aplicação e interpretação das normas de referência em todo o território nacional, a nova Resolução da ANA visa à concretização da estimada uniformidade regulatória, tendo em vista a diversidade e pluralidade das realidades existentes no tocante à prestação de serviços de saneamento básico no Brasil. 

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¹https://participacao-social.ana.gov.br/api/files/Agenda_Regulatoria_2022-2024-1663961125353.pdf Acesso em: 22 set. 2024.

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²https://participacao-social.ana.gov.br/api/files/NT_ACAO_MEDIADORA-1702320570220.pdf Acesso em: 22 set. 2024.

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³ Disponível em: https://participacao-social.ana.gov.br/Consulta/171 Acesso em: 22 set. 2024.

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Ana Paula Sovierzoski
Ana Paula Sovierzoski
Advogada da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.                                            
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Advogada da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.