Informativo Eletrônico - Edição 204 - Fevereiro / 2024

A RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO QUANTO À CORRETA ESTIMATIVA DOS QUANTITATIVOS DA PLANILHA ORÇAMENTÁRIA NAS EMPREITADAS POR PREÇO GLOBAL

Edson Francisco Rocha Neto

1. Empreitada por preço global e as estimativas de quantitativos da planilha orçamentária

A empreitada por preço global (art. 46, II, Lei 14.133) ocorre nos casos em que a Administração Pública contrata o particular para a execução de obras ou serviço por preço certo e total. Sua definição costuma ser realizada através da diferenciação da empreitada por preço unitário (art. 46, I, Lei 14.133), na qual o preço é fixado por cada unidade.

A Lei 14.133 estabeleceu que a empreitada por preço global demanda a existência de projeto executivo (art. 46, § 1º). A existência de projeto executivo permite que tanto a Administração, quanto os particulares, tenham previsibilidade e conhecimento para estimativa do valor global da remuneração do particular.

Dentre as informações prestadas pela Administração, há os quantitativos da planilha orçamentária. Cabe ao particular preencher os valores dos itens indicados pela Administração, como baliza para o valor global. O TCU superou o entendimento anterior de que os preços unitários seriam irrelevantes na empreitada por preço global.¹

O art. 56, § 5º, da Lei 14.133, prevê que: “Nas licitações de obras ou serviços de engenharia, após o julgamento, o licitante vencedor deverá reelaborar e apresentar à Administração, por meio eletrônico, as planilhas com indicação dos quantitativos e dos custos unitários, bem como com detalhamento das Bonificações e Despesas Indiretas (BDI) e dos Encargos Sociais (ES), com os respectivos valores adequados ao valor final da proposta vencedora, admitida a utilização dos preços unitários, no caso de empreitada por preço global, empreitada integral, contratação semi-integrada e contratação integrada, exclusivamente para eventuais adequações indispensáveis no cronograma físico-financeiro e para balizar excepcional aditamento posterior do contrato” (grifou-se).

A planilha com custos unitários, mesmo na empreitada por preço global, também existe para as situações que demandam aditamento do contrato. Naturalmente, trata-se de situação excepcional e não ideal.

A Administração possui a responsabilidade de estimar corretamente os quantitativos da planilha, sob pena de enriquecer ilicitamente no caso de estimativa equivocada e exigência posterior superior ao estimado. Em tal hipótese, estaria usufruindo de algo que não contratou.

O licitante, de boa-fé, tende a confiar nos dados da planilha fornecida pela Administração. Não se deve atribuir ao particular todos os riscos de variações de custo, pois ele se submete apenas aos riscos no limite do projeto executivo.² Daí a importância de adequação do projeto.

2. Posicionamento do Tribunal de Contas da União (TCU)

Por isso, o TCU já decidiu — antes da edição da Lei 14.133 — que, mesmo nas empreitadas por preço global, as planilhas orçamentárias são elementos que integram a proposta dos licitantes e servem para respaldar eventuais variações que afetem o equilíbrio econômico-financeiro:

9. O entendimento esposado pela SEFTI em sua instrução é o de que, nas licitações que envolvem a prestação de serviços, mesmo naquelas em que o regime de execução adotado seja a empreitada por preço global, as planilhas de custos e formação de preços não são elementos meramente informativos, vinculando efetivamente os contratos e, consequentemente, possibilitando a análise de itens isolados para fim de imputação de débito. 
10. Concordo em parte com esse entendimento. Assiste razão à SEFTI quando infere que as planilhas de custo constituem-se em elementos que efetivamente integram a proposta dos licitantes, não podendo ser consideradas como meramente informativas, tanto assim que tais planilhas se prestam, por exemplo, a respaldar eventuais variações de custos para efeito de reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos […].³

Em sentido similar, o TCU também decidiu que cabem termos aditivos para o fim de reequilibrar a equação econômico-financeira nos casos em que se constata erro nos quantitativos da planilha orçamentária:

9.1.8. excepcionalmente, de maneira a evitar o enriquecimento sem causa de qualquer das partes, como também para garantia do valor fundamental da melhor proposta e da isonomia, caso, por erro ou omissão no orçamento, se encontrarem subestimativas ou superestimativas relevantes nos quantitativos da planilha orçamentária, poderão ser ajustados termos aditivos para restabelecer a equação econômico-financeira da avença, situação em que se tomarão os seguintes cuidados […].⁴

3. Consideração final

A empreitada por preço global não exime a Administração Pública da responsabilidade pela estimativa adequada de quantitativos da planilha orçamentária. O particular não pode arcar com todas as variações de custos possíveis e nem assumir os riscos que não foram nem sequer previstos pela própria Administração. Havendo falha na estimativa de quantitativos da planilha orçamentária, entendida como integrante do projeto executivo, cabe aditamento ao contrato administrativo.

_____________________________
¹ JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratações administrativas. 2ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2023, p. 615.

_____________________________
² Ibidem.

_____________________________
³ TCU, Plenário, Acórdão 1.805/2014, rel. Min. José Jorge – grifou-se.

_____________________________
⁴ TCU, Plenário, Acórdão 1.977/2013, rel. Min. Valmir Campelo – grifou-se.

Compartilhe:

LinkedIn
WhatsApp
Edson Francisco Rocha Neto
Edson Francisco Rocha Neto
Mestre em Direito Processual Civil pela UERJ. Advogado da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Edson Francisco Rocha Neto
Edson Francisco Rocha Neto
Mestre em Direito Processual Civil pela UERJ. Advogado da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.