1. Introdução
O tema dos processos estruturais tem sua origem nos Estados Unidos, por meio do caso emblemático Brown vs. Board of Education, que envolveu o problema da segregação racial nas escolas norte-americanas. No Brasil, foi trazido ao debate nacional há aproximadamente uma década, principalmente por meio dos professores Marco Félix Jobim (Medidas Estruturantes: Da Suprema Corte Estadunidense ao Supremo Tribunal Federal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013) e Sérgio Cruz Arenhart (Decisões estruturais no direito processual civil brasileiro. Revista de Processo, vol. 225/2013, p. 389-410, nov./2013).
Os processos estruturais são aqueles que buscam resolver disputas litigiosas complexas que não podem ser solucionadas por meio de um provimento jurisdicional único e específico, pois exigem alteração substancial da situação concreta, por meio de uma série de providências e de um acompanhamento permanente de sua implementação.
Hoje, o país já conta com diversos juristas que se dedicam ao seu estudo, embora majoritariamente concentrando-se nos seus aspectos processuais. Apesar disso, essa figura recente no direito brasileiro transcende o direito processual, tangenciando discussões relativas ao direito administrativo, constitucional, financeiro entre outros.
Não existe consenso na doutrina em relação ao conceito de processos estruturais. Isso, inclusive, foi uma preocupação da comissão de juristas que elaborou a primeira minuta do anteprojeto de lei, como se verá adiante.
2. O conteúdo do relatório preliminar
O assunto tem ganhado crescente importância no país, não apenas no âmbito de discussões doutrinárias, mas também nos tribunais. Além de exemplos de processos estruturais nos tribunais estaduais, há ações em trâmite no STF, como a ADPF 743 (que discute a preservação do Pantanal e da Amazônia, tendo em vista os incêndios e desmatamentos). Houve, ainda a criação no STF do Núcleo de Processos Estruturais e Complexos (NUPEC), com a finalidade de “apoiar a atuação dos Gabinetes na identificação e processamento de ações estruturais e complexas” (confira aqui).
Diante desse cenário, foi constituída uma comissão de juristas responsável pela elaboração de um anteprojeto de lei para regulação dos processos estruturais, cujo relator é o Des. Federal Edilson Vitorelli, do TRF-6.
Em 16.09.2024, foi publicado o relatório preliminar do anteprojeto (confira aqui), após a realização da cinco reuniões da comissão, três audiências públicas e mais de 100 contribuições. O relatório apresenta uma minuta do anteprojeto de lei, que conta com um total de 11 artigos e a respectiva exposição de motivos.
O art. 1º conceitua o processo estrutural como sendo aquele “que tem como objeto um conflito coletivo de significativa abrangência social, cuja resolução adequada depende de providências prospectivas, graduais e duradouras”.
Na sequência, estão previstas as disciplinas relativas a: normas fundamentais do processo estrutural (art. 2º); competência (art. 3º); petição inicial, emenda, eventual rejeição do processamento na condição de “processo estrutural” e a especificação do objeto da atuação estrutural (arts. 4º e 5º); formas de participação nos processos estruturais (art. 6º); plano de atuação estrutural (art. 7º); estímulo à adoção de medidas consensuais (art. 8º); atribuições ao CNJ e ao CNMP atinentes à base de dados e à avaliação da atividade de magistrados e do MP nos processos estruturais (art. 9º); aplicação das técnicas previstas na lei a processos que tratem de questões similares (art. 10º); e, por fim, prazo para a entrada em vigor da lei (art. 11º).
3. Considerações finais
Pode notar-se, tanto por meio da redação dos artigos, quanto pela exposição de motivos, que as principais preocupações da Comissão estão relacionadas com a consensualidade dos processos estruturais, a forma de intervenção de políticas públicas e os impactos orçamentários e financeiros.
O tratamento legal dessas questões é extramamente relevante, tendo vista serem elas majoritariamente o foco dos debates travados acerca dos processos estruturais, especialmente quando se adentra no campo do direito administrativo e financeiro.
A minuta do anteprojeto ainda está em fase de elaboração, estando sujeita a emendas para que, na sequência, seja dado seguimento ao processo legislativo.