Informativo Eletrônico - Edição 200 - Outubro / 2023

OS PRAZOS DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO NA LEI 14.133/2021

Alexandre Wagner Nester

1. Licitação é procedimento 

Licitação pública é procedimento: série ordenada de atos jurídicos. Para conferir ordem ao procedimento licitatório, a Lei 14.133/2021 fixa os prazos preclusivos que precisam ser observados pelos interessados nas suas diferentes etapas.

O elemento essencial é a publicidade, como princípio norteador da licitação pública (art. 5º da Lei 14.133) e como regra do procedimento licitatório (art. 17, inc. II c/c art. 54, da Lei 14.133). A ampla divulgação dos atos essenciais do procedimento assegura a participação de todos os interessados e o controle sobre os atos praticados.

A divulgação do edital é o ato fundamental da licitação. O edital (ato convocatório) fixa as regras do jogo. A partir da sua divulgação iniciam os prazos para pedidos de esclarecimento, impugnações e para apresentação de propostas pelos interessados. Mais adiante, ocorre a divulgação do resultado do julgamento das propostas, a partir do qual inicia o prazo para interposição de recursos – e assim por diante. A regra é clara: quem perder o prazo, está fora do jogo.

2. Os prazos para apresentação de propostas e lances – art. 55 da Lei 14.133

O art. 55 da Lei 14.133 estabelece os prazos mínimos que devem ser fixados no edital, a partir da sua divulgação, para a apresentação de propostas e lances nas licitações públicas pelos particulares interessados.

Assim:
I – para aquisição de bens:
a) 8 (oito) dias úteis, quando adotados os critérios de julgamento de menor preço ou de maior desconto;
b) 15 (quinze) dias úteis, nas hipóteses não abrangidas pela alínea “a” deste inciso;
II – no caso de serviços e obras:
a) 10 (dez) dias úteis, quando adotados os critérios de julgamento de menor preço ou de maior desconto, no caso de serviços comuns e de obras e serviços comuns de engenharia;

b) 25 (vinte e cinco) dias úteis, quando adotados os critérios de julgamento de menor preço ou de maior desconto, no caso de serviços especiais e de obras e serviços especiais de engenharia;
c) 60 (sessenta) dias úteis, quando o regime de execução for de contratação integrada;
d) 35 (trinta e cinco) dias úteis, quando o regime de execução for o de contratação semi-integrada ou nas hipóteses não abrangidas pelas alíneas “a”, “b” e “c” deste inciso;
III – para licitação em que se adote o critério de julgamento de maior lance, 15 (quinze) dias úteis;
IV – para licitação em que se adote o critério de julgamento de técnica e preço ou de melhor técnica ou conteúdo artístico, 35 (trinta e cinco) dias úteis.

Já o § 1º do art. 32 fixa prazos específicos para a modalidade de diálogo competitivo: o prazo mínimo de 25 dias úteis para manifestação de interesse em participar da fase de diálogo da licitação (inc. I) e, após a conclusão desta fase, o prazo não inferior a 60 dias úteis para os licitantes pré-selecionados participarem da fase competitiva, apresentando suas propostas (inc. VIII).

Fica evidente (e nem poderia ser diferente) que prazo é tão mais extenso quanto mais complexo o contrato (tipo de contrato) ou o critério de julgamento adotado. E nada impede a fixação de prazos maiores se a complexidade da situação concreta assim exigir. O dispositivo estabelece os prazos mínimos que podem ser adotados pelo edital. A fixação de prazos muito exíguos pode limitar a participação de licitantes, com prejuízo à competitividade.

O objetivo é permitir que os particulares interessados em participar do certame tenham tempo suficiente para se preparar: levantando informações, obtendo e elaborando os documentos exigidos, organizando a sua estrutura empresarial, de modo a construir a proposta que será apresentada no prazo estabelecido.

2.1. Republicação e novo prazo em caso de modificação do edital

O parágrafo primeiro do art. 55 da Lei 14.133 (c/c o art. 15 da Instrução Normativa SEGES/MGI 73/2022 e o art. 16 da Instrução Normativa SEGE/ME 2/2023)¹ estabelece que eventuais modificações do edital exigem nova divulgação pelo mesmo modo adotado para a divulgação do edital original, com o cumprimento dos mesmos prazos antes fixados, exceto quando a alteração não comprometer a formulação das propostas.

A exceção contida na parte final do dispositivo traz a dúvida sobre quais alteração efetivamente comprometem formulação das propostas.² A resposta depende da análise do caso concreto, com base no princípio da razoabilidade. Deve-se avaliar se a alteração produzida traz prejuízo para os potenciais interessados ou, ainda, se altera as condições de participação de modo a permitir a participação de outros que inicialmente não participariam.

Se a alteração não inviabilizar a elaboração da proposta, o prazo original pode ser mantido, sem necessidade de republicação do edital e reabertura de prazos. Contudo, se a alteração acarretar, de modo inquestionável, mesmo que indiretamente, uma dificuldade intransponível para determinados interessados, inviabilizando a apresentação das propostas no prazo original, a republicação e a consequente reabertura dos prazos serão obrigatórias.

A regra visa a garantir que todos os interessados em participar do certame tenham condições de formular propostas sérias e adequadas, devidamente adaptadas às novas condições estabelecidas após a alteração – independentemente de ter sido promovida por iniciativa do próprio ente licitante, como resultado de resposta a pedidos de esclarecimento ou de impugnações ao edital, ou por determinação judicial. Em qualquer hipótese, o que importa é assegurar a devida publicidade, a isonomia entre os licitantes e, consequentemente, a efetiva oportunidade para qualquer interessado se adaptar às exigências do edital modificado.

2.2. Redução do prazo pela metade para compras do SUS

O parágrafo segundo do art. 55 admite a redução dos prazos pela metade em casos de licitações do Ministério da Saúde, no âmbito do Sistema Único de Saúde, mediante decisão fundamentada. Ou seja, cabe ao ente licitante demonstrar, fundamentadamente, a impossibilidade de cumprir os prazos normais em razão do risco que acarretam para os interesses envolvidos.

3. Os prazos para pedido de esclarecimentos e impugnação ao edital – art. 164 da Lei 14.133

O art. 164 da Lei 14.133 estabelece que qualquer pessoa está legitimada para pedir esclarecimentos sobre os termos do edital ou para impugnar os seus termos em razão de irregularidades no cumprimento da Lei.

Para tanto, o dispositivo fixa o prazo de até 3 dias úteis antes da data da abertura do certame para o protocolo (caput) e o prazo de 3 dias úteis para o ente licitante responder ao pedido (parágrafo único).

A contagem do prazo para o protocolo do pedido de esclarecimento ou da impugnação é inversa. Assim, se a sessão de abertura estiver marcada para o dia 10 (sexta-feira), a data limite para o interessado pedir esclarecimentos ou impugnar o edital será o dia 7 (terça-feira).

A contagem no prazo de 3 dias úteis para resposta do ente licitante é feita a partir do protocolo, limitado ao último dia útil anterior à data da abertura do certame. Ou seja, o prazo de resposta reduz se o pedido de esclarecimento ou a impugnação tiverem sido protocolados no último dia do prazo previsto no caput.

O objetivo da participação dos interessados é a correção de eventuais defeitos do edital e o aperfeiçoamento da atuação administrativa, mediante a contribuição dos sujeitos privados – que, invariavelmente, detêm conhecimento mais aprofundado sobre o setor (mercado) em que atuam – para identificar as soluções mais adequadas para as necessidades envolvidas.

Entretanto, os prazos exíguos fixados pelo art. 164 podem facilmente se revelar incompatíveis com o tempo necessário para analisar as questões suscitadas pelos interessados. Portanto, a depender da complexidade do objeto licitado e dos questionamentos ou impugnações apresentados, é recomendável que o ente licitante prorrogue a sessão de abertura do certame, com concessão de novos prazos aos interessados.

No regime da Lei 14.133, a ausência de impugnação ao edital não acarreta a preclusão para o exercício do direito de impugnar o edital posteriormente, apontando nulidade insanável.³

Assim, mesmo que o licitante tenha deixado de protocolar impugnação ao edital no prazo do art. 164 da Lei 14.133, não fica impedido de apontar nulidade absoluta em outras fases do certame. Nesses casos, o ente licitante não poderá recusar a impugnação com fundamento na preclusão do direito do particular.

4. Os prazos para recurso – art. 165 da Lei 14.133

O art. 165, inc. I, da Lei 14.133 estabelece o prazo de 3 dias úteis para interposição de recursos ou pedidos de esclarecimentos por parte dos licitantes contra atos administrativos praticados com base na Lei. O prazo é contado da intimação sobre o ato ou da lavratura da ata (quando couber).

Cabe recurso nas hipóteses descritas nas alíneas do inciso I do art. 165:
a) ato que defira ou indefira pedido de pré-qualificação de interessado ou de inscrição em registro cadastral, sua alteração ou cancelamento;
b) julgamento das propostas;
c) ato de habilitação ou inabilitação de licitante;
d) anulação ou revogação da licitação;
e) extinção do contrato, quando determinada por ato unilateral e escrito da Administração.

O pedido de reconsideração será cabível contra o ato do qual não caiba recurso hierárquico (art. 165, inc. II) – ou seja, qualquer ato de conteúdo decisório que não esteja relacionado nas alíneas do inciso I.

Os recursos interpostos contra atos de julgamento das propostas (caput, inc. I, al. b), bem como ato de habilitação ou inabilitação de licitante (caput, inc. I, al. c) dependem da manifestação a intenção de recorrer do licitante, que deve ser feita de imediato, sob pena de preclusão.

Para as licitações presenciais, a intenção deve ser manifestada imediatamente e deve constar em ata. Para as licitações eletrônicas, vale a regra do art. 40 da IN SEGES/ME 73/2022, segundo a qual o prazo para manifestação do interesse de recorrer deve ser concedido ao licitante ainda na sessão pública (virtual) e não pode ser inferior a 10 minutos, contados após o término do julgamento das propostas ou do ato de habilitação ou inabilitação do licitante.

O prazo para apresentação das razões recursais será de 3 dias úteis contados da data da intimação do ato, da lavratura da ata de habilitação ou inabilitação ou da ata de julgamento, conforme o caso (art. 165, § 1º, inc. I).

Os recursos devem ser recebidos pela autoridade que praticou o ato ou proferiu a decisão, que poderá reconsiderar o ato ou a decisão em 3 dias úteis, ou encaminhar o recurso à autoridade superior, que deverá proferir decisão em 10 dias úteis contados do recebimento dos autos (art. 165, § 2º).

O prazo para contrarrazões é igual (3 dias úteis) e é contado a partir da intimação sobre a interposição do recurso (art. 165, § 3º).

O prazo de recurso previsto na Lei 14.133 (3 dias úteis) é mais exíguo do que o previsto na Lei 8.666 (5 dias úteis). Essa redução promovida pela nova lei dificulta demasiadamente a reação dos licitantes contra eventuais ilegalidades e, consequentemente, o controle sobre os atos do procedimento. Cabe questionar se a solução legal, com claro propósito de imprimir celeridade ao procedimento, compensa a perda em termos de segurança jurídica.

5. O prazo para assinatura do contrato – art. 90 da Lei 14.133

O art. 90 da Lei 14.133 remete ao edital a fixação do prazo e o estabelecimento das condições para o licitante vencedor assinar o contrato (ou aceitar ou retirar o instrumento equivalente).

Esse prazo, que geralmente é fixado em dias úteis, é contado da convocação regular do licitante e o seu descumprimento acarreta a perda do direito à contratação, sem prejuízo da aplicação das sanções cabíveis, previstas em Lei.

O § 1º do art. 90 admite a prorrogação do prazo de convocação por uma vez, por igual período, mediante solicitação da parte durante seu transcurso, devidamente justificada, e desde que o motivo apresentado seja aceito pela Administração.

6. A regra da contagem dos prazos – art. 183 da Lei 14.133

A maioria dos prazos da Lei 14.133 é fixada em dias úteis. A fixação de prazo em dias corridos é exceção.

Em relação à contagem dos prazos do processo licitatório, as disposições do art. 183 da Lei 14.133 confirmam o entendimento geral consolidado sobre o tema:

– a contagem inclui o dia do início e exclui o dia do vencimento (caput);
– os prazos expressos em dias corridos serão computados de modo contínuo (inc. I);
– os prazos expressos em meses ou anos serão computados de data a data (inc. II);
– nos prazos expressos em dias úteis, serão computados somente os dias em que ocorrer expediente administrativo no ente licitante (inc. III), e se no mês do vencimento não houver o dia equivalente àquele do início do prazo, o termo será no último dia do mês (§ 3º);
– salvo disposição em contrário, considera-se dia do começo do prazo o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação na internet (§ 1º, inc. I);
– salvo disposição em contrário, considera-se dia do começo do prazo a data de juntada aos autos do aviso de recebimento, quando a notificação for pelos correios (§ 1º, inc. II);
– o prazo será prorrogado até o primeiro dia útil seguinte se o vencimento cair em dia em que não houver expediente, se o expediente for encerrado antes da hora normal ou se houver indisponibilidade da comunicação eletrônica (§ 2º).

No que couber, admite-se a aplicação supletiva e subsidiária dos dispositivos do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) relativos a prazos processuais (cf. Marçal Justen Filho. Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas. 2ª ed., RT, 2023, p. 1.808).

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¹ A IN SEGES/ME 73/2022 dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por menor preço ou maior desconto, na forma eletrônica, para a contratação de bens, serviços e obras, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional.
A IN SEGES/MGI 2/2023 dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por técnica e preço, na forma eletrônica, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional.

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² O art. 21, § 4º, da Lei 8.666 exceptua os casos em que a alteração não afeta a elaboração das propostas, criando assim uma dificuldade ainda maior, já que, em princípio, todas as alterações afetam a elaboração das propostas – embora nem todas comprometam. A redação da Lei 14.133 procurou uma solução para o impasse ao utilizar a expressão não comprometer em vez de não afetar.

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³ O art. 41, 2º, da Lei 8.666 dispõe que “Decairá do direito de impugnar os termos do edital de licitação perante a administração o licitante que não o fizer até o segundo dia útil que anteceder a abertura dos envelopes de habilitação em concorrência, a abertura dos envelopes com as propostas em convite, tomada de preços ou concurso, ou a realização de leilão, as falhas ou irregularidades que viciariam esse edital, hipótese em que tal comunicação não terá efeito de recurso”. O dispositivo enseja discussões intermináveis acerca do direito de apontar nulidades absolutas em qualquer fase do procedimento.

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Alexandre Wagner Nester
Mestre em Direito do Estado pela UFPR. Doutor em Direito do Estado pela USP. Sócio da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Alexandre Wagner Nester
Mestre em Direito do Estado pela UFPR. Doutor em Direito do Estado pela USP. Sócio da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.