Informativo Eletrônico - Edição 197 - Julho / 2023

O PROCEDIMENTO ESPECÍFICO DA LEI 12.232/2010 PARAS AS LICITAÇÕES DE PUBLICIDADE

Alexandre Wagner Nester
Júlia Venzi Gonçalves Guimarães

1. As disposições da Lei 12.232

A Lei 12.232/2010 dispõe sobre licitação e contratação pela  administração pública de serviços de publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda.

As contratações nesse campo devem observar, subsidiariamente, a Lei Geral em vigor (Lei 8.666/1993 ou Lei 14.133/2021).

1.1. O objeto das contratações que devem se subsumir à Lei 12.232 

Estão sujeitas à Lei 12.232 todas as contratações que tenham por objeto  atividades realizadas de modo integrado para “o estudo, o planejamento, a  conceituação, a concepção, a criação, a execução interna, a intermediação e a  supervisão da execução externa e a distribuição de publicidade aos veículos e  demais meios de divulgação, com o objetivo de promover a venda de bens ou serviços de qualquer natureza, difundir ideias ou informar o público em geral” (art. 2º)

Além dos próprios serviços de publicidade, a Lei admite a inclusão de atividades complementares nas contratações, caracterizadas como “serviços  especializados pertinentes”, previstos no rol taxativo do art. 2º, § 1º. 

1.2. As agências de propaganda 

Obrigatoriamente, os serviços previstos na Lei 12.232 serão contratados  em agências de propaganda, disciplinadas pela Lei 4.680/1985 (que dispõe  sobre o exercício da profissão de Publicitário e de Agenciador de Propaganda)  e que tenham certificado de qualificação técnica emitido pelo Conselho  Executivo de Normas-Padrão (CENP) (art. 4º). 

Isto é, o objeto social da entidade deve ser restrito e específico às atividades de publicidade e propaganda.

A adjudicação do objeto da licitação pode ser feita a mais de uma  agência de propaganda, sem a segregação em itens ou contas publicitárias  (art. 2º, § 3º), mediante justificativa e desde que instituído um procedimento de seleção interna entre as contratadas, cuja metodologia será aprovada pela  administração e publicada na imprensa oficial (§ 4º). 

1.3. As modalidades de processamento e os tipos das licitações

As licitações para contratos de publicidade devem observar alguma das  modalidades comuns previstas no art. 22 da Lei 8.666 (concorrência, tomada  de preços e, excepcionalmente, convite), sendo obrigatório que o critério de julgamento seja “melhor técnica” ou “técnica e preço” (arts. 5º e 10, § 10).

Esses critérios exigem que dois tipos de propostas sejam apresentados  pelas licitantes: uma que contenha o preço ofertado (proposta comercial) e  outra com a técnica a ser desenvolvida (proposta técnica). 

A obrigação de adoção dos referidos critérios de julgamento afasta  implicitamente a aplicação da modalidade pregão, que possui o critério de “menor preço” ou “maior desconto”. 

2. As características diferenciadas das licitações para contratos de publicidade 

A Lei 12.232 consagrou procedimentos específicos que resultaram em características diferenciadas para as licitações de publicidade. 

2.1. A inversão das fases no processo licitatório 

Como regra geral, nos termos do art. 43 da Lei 8.666, a abertura dos envelopes contendo os documentos de habilitação das licitantes e sua  apreciação (inc. I) deve ocorrer antes do julgamento e classificação das  propostas de acordo com os critérios estabelecidos no edital (inc. V). 

Nas licitações para contratações de serviços de publicidade, as fases  ocorrem de maneira invertida: o julgamento ocorre antes da análise dos documentos de habilitação.

De acordo com o art. 6º, inc. I, da Lei 12.232 haverá primeiramente o  conhecimento, a avaliação e o julgamento das propostas. Depois de selecionadas as mais vantajosas é que ocorrerá o exame dos documentos de habilitação (art. 11, inc. XI).

2.2. O procedimento específico para análise de propostas técnicas  

A Lei 12.232 estabeleceu um procedimento específico e diferenciado  para análise das propostas técnicas. 

2.2.1. O anonimato da proposta

Com o objetivo de imprimir objetividade e eliminar as chances de favorecimento de um determinado licitante, a Lei estabelece que o julgamento das propostas técnicas deverá ocorrer sem o conhecimento da sua autoria (art.  6º, inc. IV). 

Para tanto, exige-se a apresentação das propostas técnicas em duas vias: uma identificada e outra sem nenhuma identificação do licitante. Os envelopes são fornecidos pela administração e o seu conteúdo não pode  conter nenhuma indicação sobre a autoria da proposta. 

A não observância das regras do procedimento específico para o  julgamento das propostas técnicas sem o conhecimento da sua autoria  acarreta a nulidade da licitação (art. 12). 

2.2.2. O julgamento da proposta

O julgamento dessas propostas técnicas deve ser realizado por uma  subcomissão técnica composta por pelo menos três especialistas na área de comunicação, publicidade ou marketing (1/3 dos quais sem vínculo funcional  ou contratual com a entidade licitante), formada especialmente para a licitação  (art. 10, § 1º). 

A Lei prevê, inclusive, um processo prévio de formação dessa  subcomissão, cujos membros serão escolhidos por sorteio em sessão pública,  com a possibilidade de impugnação (com base em “fundamentos jurídicos  plausíveis”) dos especialistas indicados para o sorteio (§ 5º). 

O processo se desenvolve em quatro etapas. 

Num primeiro momento, a subcomissão técnica analisa as propostas  técnicas sem identificação – que são recebidas pela comissão de licitação  (permanente ou especial) em sessão pública (art. 11, § 4º, incs. II e III), da qual a subcomissão não participa (art. 11, § 1º). 

O resultado é lavrado em ata fundamentada e encaminhado para a  comissão de licitação (art. 11, § 4º, inc. IV).

Posteriormente, é marcada uma nova sessão pública para apuração do resultado geral das propostas técnicas. Nesse momento, a comissão de licitação confere o conteúdo das propostas sem identificação (julgadas pela  subcomissão) com as propostas identificadas, a fim de confirmar a identidade  dos licitantes classificados (inc. VII). O resultado é publicado e abre-se prazo  para recursos (inc. VIII). 

Encerrada a etapa de avaliação das propostas técnicas, é designada  nova sessão pública para classificação das propostas de preços (inc. IX), com  publicação do resultado e abertura de novo prazo para recurso (inc. X). 

Por fim, somente depois de concluída a fase de análise das propostas,  os licitantes classificados no julgamento final são convocados para apresentar  os envelopes com os documentos de habilitação (inc. XI).

O resultado da avaliação desses documentos é publicado, com abertura de novos prazos para recurso (inc. XIII). Uma vez reconhecida a habilitação dos licitantes, procede-se à homologação do procedimento e adjudicação do objeto para o vencedor (inc. XIV). 

3. O advento da Lei 14.133 e a concorrência como única modalidade  procedimental cabível 

O advento da Nova Lei Geral de Licitações (Lei 14.133) gerou  consequências aos procedimentos licitatórios para contratação de serviços de publicidade, especialmente no tocante às modalidades permitidas para o  processamento.

As cinco modalidades licitatórias previstas na Lei 8.666 são  concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão. Conforme  mencionado acima, somente as modalidades comuns devem ser adotadas  para as licitações previstas na Lei 12.232. 

3.1. A diferenciação entre modalidades comuns e especiais

Segundo Marçal Justen Filho, as modalidades comuns são aquelas  aplicáveis para contratos em geral, enquanto as modalidades especiais são  aquelas que se destinam a tipos contratuais com características diferenciadas.1

O leilão, por exemplo, é uma modalidade apropriada para contratos de alienação de bens ou de cessão de direitos, enquanto o concurso constitui  “procedimento utilizável para atos unilaterais de atribuição de honrarias ou seleção de performances artísticas ou cognitivas diferenciadas”.2 

As demais (que até o fim da vigência da Lei 8.666 serão concorrência,  tomada de preços e convite) podem ser utilizadas para contratos em geral e, portanto, são modalidades comuns aplicáveis às contratações de serviços de publicidade. 

Contudo, de acordo com essa caracterização, a Lei 14.133 prevê  apenas duas modalidades comuns de licitação: o pregão e a concorrência (art.  28). Não há mais previsão quanto à tomada de preços e ao convite. Já as  demais modalidades dispostas (concurso, leilão e diálogo competitivo)3 devem  ser caracterizadas como especiais. 

3.2. A concorrência como única modalidade cabível 

Assim, tendo em vista que o critério de julgamento no pregão deve ser  “menor preço” ou “maior desconto” (art. 6º, inc. XLI, da Lei 14.133), o que afasta implicitamente o seu cabimento (já que o critério deve ser “melhor  técnica” ou “técnica e preço”), a única modalidade permitida para o  processamento das licitações da Lei 12.232 será a concorrência.

Isso deverá ser observado a partir da revogação da Lei 8.666 – que  atualmente está prevista para ocorrer em 30.12.2023, conforme disposto no art. 193, inc. II, da Lei 14.133, com a redação conferida pelo art. 3º da Lei Complementar 198/2023. 

4. Conclusão 

A Lei 12.232 introduziu regras relacionadas a procedimentos específicos  para as licitações de publicidade, que as caracterizam de forma diferenciada e  observam a singularidade do objeto das contratações.

Em contraste com a regra geral, a fase de julgamento das propostas  ocorre antes da fase de habilitação. Além disso, a análise das propostas  técnicas deve seguir um procedimento próprio, exigindo o anonimato das proponentes e a criação de uma subcomissão técnica destinada  exclusivamente para esse exame.

Até então, uma licitação para contratação de serviços de publicidade  pode se dar por meio concorrência, tomada de preços e, excepcionalmente,  convite. Contudo, isso deve mudar com a revogação da Lei 8.666. As  modalidades de tomada de preços e convite foram extintas pela nova Lei Geral  de Licitações e Contratações Pública (Lei 14.133). Consequentemente, o  processamento dessas licitações deverá se dar, obrigatoriamente, por meio de concorrência.

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1 Comentários à Lei de Contratos e Publicidade da Administração: Lei 12.232/2010. Belo  Horizonte: Fórum, 2020, p. 230-232. 

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2 Marçal Justen Filho, op. cit., p. 230. 

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3 O diálogo competitivo é vocacionado a atender particularmente a demandas complexas, em  ambientes com elevado grau de risco ou incerteza (nesse sentido, cf. Guilherme F. Dias  Reisdorfer. Diálogo Competitivo: o regime da Lei nº 14.133/2021 e sua aplicação às licitações  de contratos de concessão e parcerias público-privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2022, p. 25).  Assim, entende-se não se caracterizar como uma modalidade comum, a ser aplicada em  contratações gerais.

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Alexandre Wagner Nester
Mestre em Direito do Estado pela UFPR. Doutor em Direito do Estado pela USP. Sócio da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Júlia Venzi Gonçalves Guimarães
Júlia Venzi Gonçalves Guimarães
Pós-graduada em Direito Administrativo pelo IDP. Advogada da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Alexandre Wagner Nester
Mestre em Direito do Estado pela UFPR. Doutor em Direito do Estado pela USP. Sócio da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Júlia Venzi Gonçalves Guimarães
Júlia Venzi Gonçalves Guimarães
Pós-graduada em Direito Administrativo pelo IDP. Advogada da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
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