1. O Crescimento das Concessões e PPPs no Brasil
A expansão das concessões e parcerias público-privadas (PPPs) no Brasil tem ganhado força nos últimos anos, impulsionada pela necessidade do Estado em buscar alternativas para financiar investimentos em infraestrutura e serviços públicos essenciais. Os investimentos públicos em infraestrutura no Brasil não alcançaram nem 2% do PIB entre 2022 e 2024¹.
Essas parcerias têm sido uma solução estratégica para suprir a falta de recursos públicos e garantir a manutenção e o avanço em áreas fundamentais como transporte, energia, saúde e saneamento. Em 2024, tais contratos de concessão e PPPs destravaram R$ 73 bilhões em investimentos², evidenciando a crescente participação do setor privado na economia nacional, com maior foco nos setores de rodovias, água e esgoto, e mobilidade:
Nos últimos anos, o Brasil testemunhou um aumento expressivo no número de PPPs, que são um tipo de concessão regida pela Lei 11.079/2004. A segunda década de implementação dessas parcerias resultou em um crescimento de quase 300% nos contratos³:
Diferentemente das concessões comuns, estruturadas com base na Lei 8.987/1995, as PPPs permitem um maior equilíbrio entre a participação do setor privado e o suporte estatal.
Regidas pela Lei 11.079/2004, as PPPs podem assumir a forma de concessões patrocinadas, quando há contraprestação pecuniária do poder público além da tarifa paga pelo usuário, ou concessões administrativas, em que a remuneração advém integralmente do Estado.
Essa configuração torna as PPPs mais atrativas em setores em que a viabilidade econômica do serviço depende de aportes governamentais, mitigando riscos para investidores e garantindo a execução de projetos estratégicos mesmo diante das restrições fiscais do setor público.
Esse movimento reflete uma mudança estrutural na forma como o país financia projetos de infraestrutura, com uma dependência crescente do capital privado para suprir lacunas deixadas pela redução dos investimentos públicos.
2. A Relevância das Concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs)
A transformação do modelo de prestação de serviços públicos, incluindo a adoção de concessões e PPPs, reflete uma tentativa de integrar a eficiência do setor privado com o compromisso público de garantir serviços essenciais.
Entre 1980 e meados dos anos 1990, o Brasil passou por intensa instabilidade macroeconômica e significativo desequilíbrio interno, agravados pelo aumento dos preços do petróleo, altas taxas de juros internacionais e retração das poupanças nacionais. Esse cenário resultou em endividamento crescente e políticas emergenciais de contenção fiscal, comprometendo severamente os investimentos de longo prazo e exigindo a criação de mecanismos para viabilizar a modernização da infraestrutura nacional.⁴
A concessão de serviços públicos, por meio da Lei 8.987/1995 e posteriormente por meio da Lei 11.079/2004, surgiu como uma alternativa para permitir que o Estado transferisse a execução de serviços para a iniciativa privada, mantendo a titularidade e o controle sobre esses serviços. Trata-se de uma combinação de recursos e expertise privada em projetos de grande porte com a responsabilidade pública na garantia da qualidade e da equidade na prestação de serviços.
Dessa forma, é possível manter, expandir e modernizar a infraestrutura pública mesmo num cenário de contenção de gastos e escassez de recursos para setores essenciais, fortalecendo a participação do setor privado como parceiro estratégico no desenvolvimento nacional.
3. O Impacto das Restrições Fiscais nos Investimentos Públicos
A limitação atual da capacidade do Estado de investir diretamente em setores econômicos é, em parte, consequência de medidas fiscais adotadas para conter a crise econômica de 2014 e o crescimento das despesas públicas.
A Emenda Constitucional 95/2016, instituiu o teto de gastos públicos, restringindo o aumento das despesas primárias da União por um período de 20 anos. Tal mecanismo impediu a ampliação de investimentos públicos, mesmo em setores estratégicos para o desenvolvimento econômico e social, como infraestrutura.
O novo arcabouço fiscal (Lei Complementar 200/2023) substituiu o antigo regime de teto de gastos, mas manteve restrições significativas para a expansão das despesas públicas.
O crescimento dos gastos públicos segue regras específicas. Se o resultado primário estiver dentro da meta (de no mínimo 0,6% ao ano e no máximo 2,5%), as despesas poderão crescer 70% do aumento da receita primária acumulada até junho daquele ano. Se o resultado primário ficar abaixo da meta inferior, o aumento dos gastos será reduzido para 50% do crescimento da receita, mantendo-se os mesmos limites de variação anual:
As restrições fiscais de 2016 impactaram o crescimento econômico do Brasil. Após a recessão de 2015 e 2016, quando a economia encolheu mais de 7%, os anos seguintes apresentaram crescimento modesto, de apenas 1% ao ano entre 2017 e 2019. Em 2020, a crise econômica foi agravada pela pandemia, resultando em uma das maiores recessões da história do país.⁵
O mesmo deve ocorrer em relação ao novo arcabouço fiscal, uma vez que também impões restrições fiscais. o Estado brasileiro tornou-se cada vez mais dependente dos investimentos privados para viabilizar projetos de infraestrutura.
Nesse contexto, as concessões e PPPs, com destaque para as PPPs, emergem como alternativas estratégicas para viabilizar projetos de infraestrutura, pois envolvem investimentos privados aliados aos investimentos públicos.
4. O Custo do Financiamento e o Impacto da Selic Elevada
Muito embora as concessões e PPPs sejam uma alternativa aos investimentos exclusivamente públicos, a sua viabilidade é diretamente afetada pelo custo do financiamento dos projetos – ou seja, pelas taxas de juros.
O Banco Central prevê uma taxa Selic, que é a taxa básica de juros, de 15% para este ano⁶, o que encarece o crédito e torna os investimentos em infraestrutura menos atraentes para o setor privado. Juros elevados aumentam o custo do capital e reduzem o retorno esperado dos projetos, limitando o número de interessados em novos contratos.
Além disso, a alta do dólar também contribui para o desinteresse de investidores em grandes empreendimentos. Segundo Maurício Portugal Riberio, o valor da moeda americana eleva a possibilidade de leilões vazios nos próximos dois anos⁷.
Esse cenário gera incerteza para o planejamento estatal e pode resultar em uma estagnação dos investimentos essenciais para o desenvolvimento do país. E pode comprometer a sustentabilidade de contratos já firmados, impactando a execução de obras e a qualidade dos serviços prestados à população.
5. Desafios e Perspectivas para as Concessões e PPPs
Embora as concessões e PPPs tenham se consolidado como alternativa viável para a realização de investimentos, há desafios que não podem ser ignorados, tais como a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, a necessidade de regulação e governança eficientes para garantir segurança jurídica e a qualidade dos serviços, o monitoramento das concessões para assegurar a sustentabilidade dos investimentos, o aumento do custo do capital decorrente da taxa básica de juros elevada, e o risco o esvaziamento de leilões.
A experiência brasileira demonstra que especialmente a previsibilidade regulatória e a segurança jurídica são fundamentais para o sucesso de projetos vinculados ao Estado, como concessões e PPPs, influenciando diretamente as motivações e decisões dos agentes envolvidos. Regulação eficiente, política pública bem estruturada e manutenção do equilíbrio econômico-financeiro também são essenciais para assegurar a atratividade dos investimentos e a qualidade dos serviços concedidos⁸.
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¹ PODER360. “Brasil não investiu 2% do PIB em infraestrutura em 2 anos, diz estudo”. Disponível em: https://www.poder360.com.br/poder-economia/brasil-nao-investiu-2-do-pib-em-infraestrutura-em-2-anos-diz-estudo/. Acesso em: 07.05. 2025.
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² CNN Brasil. “Concessões e PPPs em 2024 destravam investimento de R$ 77 bi.” Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/concessoes-e-ppps-em-2024-destravam-investimento-de-r-77-bi/#:~:text=O%20ano%20de%202024%20teve,antecipado%20todo%20m%C3%AAs%20pela%20CNN. Acesso em: 05.03.2025.
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³ CNN Brasil. “Contratos de PPPs avançam quase 300% em segunda década de parcerias no Brasil.” Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/contratos-de-ppps-avancam-quase-300-em-segunda-decada-de-parcerias-no-brasil/#:~:text=O%20n%C3%BAmero%20de%20contratos%20de,antecipado%20todo%20m%C3%AAs%20pela%20CNN. Acesso em: 05.03.2025.
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⁴ MORAES, Salus. A Parceria, Associação e Colaboração entre o Poder Público e a Iniciativa Privada na História. In: Considerações Iniciais: História e Conceito de PPPs. Rio de Janeiro: CEEJ, 2019. p. 63-67.
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⁵ LACERDA, Antônio Corrêa de; PIRES, Julio Manuel. O Pensamento de Celso Furtado e a crise econômica atual. In: LACERDA, Antônio Corrêa de (org.). Celso Furtado, 100 anos: pensamento e ação. São Paulo: Editora Contracorrente, 2020. p. 56-61.
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⁶ Banco Central do Brasil. Relatório de Mercado Focus. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/publicacoes/focus. Acesso em: 05.03.2025.
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⁷ FOLHA DE S. PAULO. “Alta da Selic e do dólar eleva possibilidade de leilões vazios nos próximos dois anos”. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2024/12/alta-da-selic-e-do-dolar-eleva-possibilidade-de-leiloes-vazios-nos-proximos-dois-anos.shtml. Acesso em: 07.03.2025.
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⁸ COHEN, Isadora; FAJARDO, Gabriel; FERREIRA, Izabel; CARELLI, Carolina. “Flexibilidade e previsibilidade nos contratos de concessões e PPPs”. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/infra/flexibilidade-e-previsibilidade-nos-contratos-de-concessoes-e-ppps. Acesso em: 07.03.2025.