A RESERVA DE CARGOS PARA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (PCD) E REABILITADOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL COMO REQUISITO DE HABILITAÇÃO – ENTRE A LEI 8.666/1993 E A LEI 14.133/2021

1. Introdução  

Na vigência da Lei 8.666, a reserva de cargos para pessoa com  deficiência (PCD) ou reabilitados da Previdência Social passou a ser uma  exigência em licitações. A exigência tal como prevista gerou dúvidas sobre a  sua qualificação jurídica e dificuldades na sua aplicação. 

A Lei 14.133 alterou a qualificação jurídica da exigência, solucionando  um problema anterior. O exame dessa disciplina permite identificar a nova  qualificação jurídica e detectar novas questões que podem surgir no futuro.  Esse é o objeto do presente artigo.

2. A reserva de cargos na Lei 8.666 

A Lei 8.666, com as alterações produzidas pela Lei 13.146/2015 (Estatuto  da Pessoa com Deficiência), prevê o seguinte: 

Art. 3º (…)  
§ 2o Em igualdade de condições, como critério de desempate, será assegurada  preferência, sucessivamente, aos bens e serviços:  
V – produzidos ou prestados por empresas que comprovem cumprimento de reserva de  cargos prevista em lei para pessoa com deficiência ou para reabilitado da Previdência  Social e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação.  
Art. 3º (…)  
§ 5o Nos processos de licitação, poderá ser estabelecida margem de preferência para:  
II – bens e serviços produzidos ou prestados por empresas que comprovem cumprimento  de reserva de cargos prevista em lei para pessoa com deficiência ou para reabilitado da  Previdência Social e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação.

Portanto, a reserva de cargos foi prevista como critério de desempate (Lei  8.666, art. 3º, §2º, inc. V) ou para o estabelecimento de margem de preferência  (Lei 8.666, art. 3º, §5º). No primeiro caso, uma situação de empate entre  licitantes pode ser resolvida com a vitória de empresa que cumpra a reserva de cargos prevista em Lei. No segundo caso, admite-se que uma norma seja  editada para estabelecer margem de preferência para as empresas que atendam as exigências. 

Porém, na prática, há editais baseados na Lei 8.666 e na Lei 10.520 que  previram o atendimento à reserva de cargos para PCD como requisito de habilitação, não como critério de desempate ou para efeito de estabelecer uma  margem de preferência. Reputa-se que uma exigência nesses termos pode ser objeto de questionamento, por diversos fundamentos jurídicos – inclusive os limites expressos previstos na Lei 8.666. 

3. A reserva de cargos na Lei 14.133/2021 

O menor desconto segue a mesma lógica do menor preço, com a  diferença que os lances são percentuais de desconto em face do preço máximo  fixado pela Administração. Como decorrência, o orçamento não poderá ser  sigiloso e deverá ser divulgado imediatamente (art. 24, parágrafo único da Lei 14.133/2021). Poderá ser adotada em pregão ou concorrência.

1.3. Melhor técnica ou conteúdo artístico 

O art. 63, inc. IV, da Lei 14.133, prevê o seguinte: 

Art. 63. Na fase de habilitação das licitações serão observadas as seguintes disposições: 
I – poderá ser exigida dos licitantes a declaração de que atendem aos requisitos de  habilitação, e o declarante responderá pela veracidade das informações prestadas, na  forma da lei; 
II – será exigida a apresentação dos documentos de habilitação apenas pelo licitante  vencedor, exceto quando a fase de habilitação anteceder a de julgamento; 
III – serão exigidos os documentos relativos à regularidade fiscal, em qualquer caso,  somente em momento posterior ao julgamento das propostas, e apenas do licitante mais  bem classificado; 
IV – será exigida do licitante declaração de que cumpre as exigências de reserva de  cargos para pessoa com deficiência e para reabilitado da Previdência Social,  previstas em lei e em outras normas específicas.

3.1. A reserva de cargos como requisito de habilitação   

Portanto, diferentemente da Lei 8.666, a Lei 14.133 previu  expressamente a reserva de cargos para pessoas com deficiência e para  reabilitado da Previdência Social como um requisito de habilitação. Marçal  Justen Filho qualifica a exigência como um requisito de habilitação social  (Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas: Lei 14.133/2021. São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2021, pp. 879-880). 

3.2. A obrigatoriedade ou facultatividade da exigência  

No tocante aos requisitos de habilitação de um modo geral (i.e.,  habilitação jurídica, técnica, fiscal, social, trabalhista e econômico-financeira),  prevalece o entendimento de que a Lei estabelece um elenco máximo, e cabe  ao edital fixar os requisitos mínimos necessários tendo em vista o objeto  licitado. Mas há certos requisitos de habilitação que são absolutos, no sentido  de serem exigíveis em todas as situações, independentemente do objeto  licitado (p. ex., a habilitação jurídica).

Na aplicação da Lei 14.133, tende a prevalecer o entendimento de que a  reserva de cargos para PCD e para reabilitados da Previdência Social é um requisito de habilitação absoluto, que deve ser exigido em todos os casos (não  se aplicando, naturalmente, quando a legislação especifica sobre PCD não  exigir a reserva de cargo, ou quando houver particularidades da empresa/setor  de atuação que afastem a exigência).

Nas situações mais usuais, em princípio, não há margem para a  Administração dispensar essa exigência. Isso decorre da redação empregada  pela Lei (“Art. 63. Na fase de habilitação das licitações serão observadas as seguintes disposições: IV – será exigida do licitante declaração de que cumpre as exigências de reserva de cargos para pessoa com deficiência e para  reabilitado da Previdência Social, previstas em lei e em outras normas  específicas”).

Portanto, em regra os editais elaborados com base na Lei 14.133 devem  exigir a declaração de atendimento dessas condições. E a ausência de declaração de atendimento ou o descumprimento das exigências de reservas  de cargos deve implicar a inabilitação da empresa licitante.

3.3. O momento de comprovação da reserva de vagas 

Pode haver dúvida sobre o momento de comprovação do atendimento à  reserva de cargos (se por ocasião da licitação ou se apenas no momento de celebrar o contrato). Marçal Justen Filho afirma que, por sua natureza, o  requisito deve ser atendido pela empresa independentemente da licitação, o  que “envolve comprovação quanto à sua organização em momento anterior à  instauração da disputa” (Comentários… p. 879).

Em princípio, portanto, a reserva de cargos deve ser respeitada por  ocasião da licitação, e inclusive durante a execução do contrato. 

Quanto a isso, e apenas para efeito de comparação, note-se que há na Lei 14.133 previsão de que o edital pode exigir percentual mínimo de mão de obra de mulheres vítimas de violência doméstica (art. 25, §9º, inc. I) e de oriundos ou egressos do sistema prisional (art. 25, §9º, inc. II). 

Nestes casos, o edital pode ou não prever a exigência (que, portanto, é  facultativa). Se houver tal exigência no caso concreto, a comprovação deve ser  feita apenas no momento da celebração do contrato. Outra diferença é que essa mão de obra composta por mulheres vítimas de violência doméstica ou por oriundos ou egressos do sistema prisional deve ser utilizada na execução  do contrato resultante da licitação – diferente dos empregados PCD e  reabilitados da Previdência Social, que devem atuar na empresa mas não necessariamente na execução do contrato celebrado. 

3. Conclusão  

Portanto, a reserva de cargos para PCD ou reabilitados da Previdência  Social como requisito de habilitação é uma novidade da Lei 14.133, o que  envolveu alteração da qualificação jurídica atribuída pela Lei 8.666. Em princípio, a exigência é obrigatória em licitações regidas pela Lei 14.133  (ressalvadas as situações excepcionais acima indicadas), e o atendimento  deve ser demonstrado por ocasião da licitação, e não como condição para a  celebração do contrato.