Informativo Eletrônico - Edição 205 - Março / 2024

ESTRATÉGIAS REGULATÓRIAS NAS CONCESSÕES DE SERVIÇO PÚBLICO E A VINCULAÇÃO AO EDITAL

Stella Farfus Santos
Jolivê Alves da Rocha Filho

A regulação de concessões de serviço público pode ser realizada ao menos por duas formas distintas: a regulação discricionária e a regulação contratual. Na regulação discricionária, a remuneração da concessionária é fixada conforme a estrutura de custos ao longo da prestação dos serviços. O objetivo primordial é manter os preços (ou tarifas) alinhados aos custos, buscando evitar que o parceiro privado se utilize de sua posição para cobrar preço supracompetitivo.¹ Logo, a regulação discricionária fixa o preço por simulação do ambiente concorrencial.

Por outro lado, na regulação contratual, a definição do preço (ou tarifa) ocorre na licitação. A evolução do preço durante a execução do objeto da concessão observa parâmetros objetivos previamente definidos no contrato.

Tendo informações sobre a tarifa, o parceiro privado também já precisa contar, desde o edital da licitação, com as demais informações necessárias para o cálculo do seu retorno. Por isso, essa estratégia regulatória será adequada quando houver determinação precisa, também na minuta de contrato, sobre investimentos e responsabilidades do parceiro privado.

A definição da metodologia tarifária e de temas no contrato de concessão garante maior densidade normativa ao contrato e menor discricionariedade do órgão regulador.² Em outras palavras, a regulação contratual constitui um “limite interventivo”³ à atuação da agência reguladora.

Para os contratos que adotam a regulação contratual, a discricionariedade deve apenas complementar a regulação estabelecida em contrato – e desde que as definições pretendidas pelos entes reguladores guardem coerência com as disposições contratuais e não desnaturem toda a lógica de regulação estabelecida no instrumento contratual.

Não há como a atuação discricionária afastar ou aplicar ditames contraditórios com a regulação contratual. As condições previstas no contrato devem prevalecer em relação a um regime geral, uma vez que vinculam plenamente a Administração Pública.

Logo, cabe às agências reguladoras sempre interpretar as cláusulas já existentes nos contratos de concessão. Contudo, por “interpretação”, não é possível compreender a possibilidade de desnaturação completa da regulação prevista em contrato.

A regulação contratual não encerra a discricionariedade do órgão regulador. Atuações regulatórias tradicionais continuam presentes, mas limitadas pela lógica regulatória estabelecida no edital.

Eventuais incompletudes contratuais somente podem ser interpretadas à luz da regulação contratual, sob pena de frustração das finalidades consolidadas no edital. 

Ao se tratar de estratégias regulatórias, o sentido de vinculação ao edital é expandido. A definição clássica – de que a Administração se vincula aos termos do edital – deve ser atualizada para abranger a lógica da estrutura regulatória. Se determinado contrato adota opção regulatória (seja ela discricionária ou contratual), a escolha torna-se princípio reitor do contrato. Seus efeitos se projetam sobre toda a relação jurídica, inclusive nas interpretações a serem realizadas pelo órgão regulador.

Esse tema foi aprofundado em artigo elaborado pelos autores publicado originalmente na Agência Infra (acesse aqui).

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1 FREITAS, Rafael Véras; SANDOVAL, Daniela. O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico e os novos quadrantes da regulação contratual. Coluna Direito da Infraestrutura. Disponível em https://www.editoraforum.com.br/noticias/o-novo-marco-regulatorio-do-saneamento-e-os-novos-quadrantes-da-regulacao-contratual-coluna-direito-da-infraestrutura/#_ftnref4

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2 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Concessões. Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 368.

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3 FREITAS, Rafael Véras; SANDOVAL, Daniela. O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico e os novos quadrantes da regulação contratual. Coluna Direito da Infraestrutura. Disponível em https://www.editoraforum.com.br/noticias/o-novo-marco-regulatorio-do-saneamento-e-os-novos-quadrantes-da-regulacao-contratual-coluna-direito-da-infraestrutura/#_ftnref4

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Stella Farfus
Stella Farfus Santos
Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar. Advogada da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Jolivê Rocha
Jolivê Alves da Rocha Filho
Advogado da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.                                                                                              
Stella Farfus
Stella Farfus Santos
Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar. Advogada da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Jolivê Rocha
Jolivê Alves da Rocha Filho
Advogado da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.