1. Infraestrutura educacional
A questão da oferta de vagas na educação infantil e do aprimoramento da infraestrutura escolar no Brasil constitui um desafio para os entes federativos, que frequentemente se deparam com dificuldades no cumprimento das metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação (PNE).
A conjuntura foi adversamente agravada por fatores como a pandemia de Covid-19 e por restrições orçamentárias, o que culminou em estagnação e, em certos casos, retrocesso nos indicadores educacionais.
Desde então, além de não terem sido constatadas melhorias relevantes no setor, que permitissem o atendimento às metas do PNE, são identificados problemas graves no setor, como a recente falta de recursos para aquisição de materiais didáticos, sobretudo para a etapa inicial do ensino fundamental (confira a notícia a respeito do assunto).
A análise do PNE revela um quadro de subfinanciamento no setor, sendo este um dos principais entraves para a modernização e expansão da infraestrutura educacional. A meta de investir 7% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação, por exemplo, não foi alcançada, com o patamar de gastos permanecendo em 5,1% (fonte: Senado Federal – confira aqui).
Essa insuficiência de recursos públicos cria uma significativa lacuna de investimento, comprometendo a capacidade do Estado de prover as melhorias necessárias em escolas e universidades e, em segunda ordem, a própria educação dos cidadãos brasileiros.
Diante desse cenário, a atração de capital privado emerge como uma alternativa para suprir a carência de verbas e viabilizar os avanços estruturais que a educação brasileira demanda, considerando sobretudo a complexidade e a escala dos investimentos requeridos, somadas às restrições orçamentárias.
Nessa busca por modelos alternativos de financiamento e gestão do setor, as concessões e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) revelam-se instrumentos jurídicos e econômicos potenciais para auxiliar na abordagem desse quadro, ao viabilizar a atração de investimentos privados para a construção, manutenção, gestão e operação de unidades educacionais.
As PPPs, instituídas no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 11.079/2004, e as concessões, reguladas pela Lei 8.987/1995, oferecem um arcabouço para a colaboração entre o setor público e o privado, com o intuito de otimizar recursos e aprimorar a eficiência na prestação de serviços de interesse público (RIBEIRO, Mauricio Portugal. Concessões e PPPs: melhores práticas em licitações e contratos. Rio de Janeiro, 2010).
Ambas as modalidades exigem uma compreensão aprofundada das normas legais para garantir sua eficácia e conformidade jurídica, tendo como objetivo principal promover a eficiência econômica na prestação de serviços de interesse público, permitindo investimentos com recursos privados e o compartilhamento de riscos entre as partes.
2. As concessões e PPPs no contexto educacional
As concessões e PPPs configuram-se como contratos administrativos de longo prazo, nos quais o setor privado assume a responsabilidade pela execução de serviços ou obras de interesse público, em troca de uma contraprestação paga pelo Poder Público, tarifas cobradas dos usuários ou uma combinação de ambos.
Tais mecanismos estão relacionados ao serviço público, representando o compromisso das partes contratantes em atender necessidades essenciais, como ocorre no setor educacional (JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003, p. 11).
Os primeiros contratos dessas modalidades remontam a um contexto marcado pela falta de recursos técnicos e de capital nacional para viabilizar projetos de infraestrutura, o que exigia um ambiente favorável capaz de oferecer segurança aos investidores privados.
O principal objetivo desses contratos era proteger o parceiro privado contra eventuais concorrências durante o período necessário para amortizar os investimentos, assegurando, assim, o retorno adequado na implantação e operação do serviço.
No setor educacional, estas modalidades têm sido aplicadas para a construção e operação de escolas, abrangendo não apenas a infraestrutura física, mas também a gestão de serviços não-pedagógicos, como limpeza, segurança, manutenção predial e alimentação (Contrato de Concessão nº 02/2025. Concorrência Internacional nº 002/2024. PPP Escolas – Lote Leste. Estado de São Paulo).
Os serviços não-pedagógicos compreendem todas as atividades de apoio e infraestrutura necessárias para o funcionamento adequado da escola, sem incluir o corpo docente ou a gestão pedagógica direta da sala de aula.
Nesse sentido, a adoção de PPPs e concessões na educação visa, precipuamente, à otimização da capacidade de investimento do Estado e à incorporação de expertise e eficiência do setor privado.
Além disso, delegar a responsabilidade pela infraestrutura e serviços de apoio ao particular possibilita ao Poder Público concentrar seus esforços e recursos na atividade pedagógica, aprimorando a qualidade do ensino nas escolas.
3. O Projeto “Novas Escolas” em São Paulo
Nesse cenário, e acompanhando alguns outros exemplos bem-sucedidos de implementação de PPPs na educação, como o programa Inova BH (rede municipal de Belo Horizonte), o estado de São Paulo implementou um programa de PPPs para a construção e gestão de “Novas Escolas”, com o objetivo de expandir e modernizar sua rede de ensino médio e fundamental II.
Esse projeto, dividido em lotes (Lote Leste e Lote Oeste), prevê a construção, manutenção, conservação, gestão e operação dos serviços não-pedagógicos de dezenas de novas unidades de ensino. Os serviços pedagógicos permanecerão sob responsabilidade da secretaria de Educação.
As Concorrências para o Lote Oeste e Leste exemplificam a abordagem adotada pelo governo paulista.
Nos editais, o modelo de concessão administrativa foi escolhido, o que implica que a remuneração da concessionária será integralmente paga pelo Poder Concedente, sem a cobrança direta de tarifas dos usuários (alunos ou pais). Os contratos também preveem mecanismos de remuneração por meio de receitas acessórias, cuja implementação depende de autorização da ARSESP.
Os contratos estabelecem um período de longo prazo para a execução dos serviços, o que implica um compromisso financeiro significativo por parte do Estado.
O “Lote Oeste” visa à construção de 17 unidades escolares que, em conjunto, proporcionarão 462 salas de aula e um total de 17.160 vagas para estudantes do ensino fundamental II e ensino médio.
Essas escolas serão distribuídas em 14 municípios paulistas, incluindo Araras, Bebedouro, Campinas, Itatiba, Jardinópolis, Lins, Marília, Olímpia, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, Rio Claro, São José do Rio Preto, Sertãozinho e Taquaritinga.
O “Lote Leste”, por sua vez, abrange a concessão administrativa para a construção, manutenção, conservação, gestão e operação dos serviços não-pedagógicos de 16 novas unidades de ensino de nível médio e ensino fundamental II no estado de São Paulo.
A previsão é que as escolas do “Lote Leste” ofereçam um total de 15.680 vagas em 448 salas de aula. As unidades serão distribuídas em 13 municípios: Guarulhos, Itaquaquecetuba, Biritiba Mirim, Caraguatatuba, Ferraz de Vasconcelos, Guaratinguetá, Guarujá, Mogi das Cruzes, Santa Branca, Santo André, São Bernardo do Campo, São José dos Campos e Suzano (fonte: Secretaria de Parcerias em Investimentos do Estado de São Paulo – confira aqui).
A fiscalização e coordenação da execução do contrato ficarão sob responsabilidade do governo paulista, por meio da Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (ARSESP), que deve monitorar a qualidade e a conformidade dos serviços prestados.
4. Conclusão
As concessões e PPPs representam uma alternativa para abordar a demanda por vagas e a necessidade de modernização da infraestrutura educacional e aprimoramento do ensino no Brasil.
Caso bem estruturadas, podem implicar diversos benefícios ao sistema de educação brasileiro. Contudo, é indispensável que os contratos detalhem com precisão as responsabilidades das partes e possuam mecanismos efetivos de controle da qualidade da prestação dos serviços contratados.
Nesse sentido, o programa “Novas Escolas” em São Paulo, com a delegação dos serviços não-pedagógicos, ilustra a complexidade e o potencial dessas parcerias, evidenciando a necessidade de um arcabouço jurídico e de uma modelagem contratual criteriosa.
A continuidade do engajamento governamental, a busca pela modernização dos modelos de contratação e a atenção à preservação do caráter público e social da educação serão essenciais para o sucesso, desenvolvimento e a expansão dessas iniciativas em todo o território nacional.

