A REGULAMENTAÇÃO DA NOVA LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS (LEI 14.133/2021)

1. A convivência dos dois regimes por dois anos

A nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos entrou em vigor na  data da sua publicação em 1º de abril de 2021 (art. 194), mas ainda convive  com a legislação anterior sobre o tema (Lei 8.666, Lei 10.520 e Lei 12.462). 

O art. 193, inc. I, da nova Lei revogou os arts. 89 a 108 da Lei 8.666 – que dispõem sobre os crimes, as penas, os processos e os procedimentos  judiciais em matéria de licitações e contratos públicos.

Mas o art. 193, inc. II, determinou que os demais dispositivos da Lei  8.666, a Lei 10.520 e os arts. 1º a 47-A da Lei 12.462 continuarão em vigor e  só serão revogados após dois anos da publicação do novo marco legal. 

O art. 190 deixou claro que os contratos firmados antes da entrada em  vigor da nova Lei continuarão a ser regido pelas regras da legislação revogada.  E o art. 191 possibilitou à Administração optar por um ou outro regime durante  o período de convivência dos dois regimes, vedada a aplicação combinada.

 Esse prazo de convivência termina em 30 de março de 2023.   

2. A necessidade de regulamentação da nova Lei

Boa parte dos dispositivos na Lei 14.133 tem aplicação imediata e  automática. Contudo, existem diversas normas que exigem regulamentação  específica.

A nova Lei contém regras autoaplicáveis de cunho penal, sobre recursos  administrativos, ou mesmo as que estabelecem o dever de planejamento e de  governança nas contratações públicas.

Também contempla soluções que, muito embora possam ser  futuramente disciplinadas por regulamento, podem ser extraídas da  interpretação sistemática do ordenamento jurídico.

Mas existem diversas matérias que, por disposição expressa, deverão  ser submetidas à regulamentação específica, pois dependem de decreto para  alcançar maior grau de concretude, mediante a especificação de critérios,  soluções e providências indispensáveis à sua aplicação. 

3. A regulamentação das contratações por dispensa de licitação

O primeiro ato normativo editado na esfera federal para regulamentação Lei 14.133 foi a Instrução Normativa SEGES/ME 67, de 8 de julho de 2021, que  dispõe sobre a dispensa de licitação, na forma eletrônica, e institui para tanto o  Sistema de Dispensa Eletrônica. 

Isso permitiu que diversas contratações fossem realizadas nos últimos  com base no artigo 75 da nova Lei, que estabelece o rol taxativo das hipóteses  de contratação direta por dispensa.

4. A criação do Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações  Públicas e do Portal Nacional Contratações Públicas 

Em agosto de 2021 foi dado mais um passo importante com a edição do  Decreto 10.764, de 09 de agosto de 2021, que dispõe sobre o Comitê Gestor  da Rede Nacional de Contratações Públicas, de que trata o § 1º do art. 174 da  Lei 14.133. 

 Um dos efeitos práticos mais relevantes dessa regulamentação foi a  instituição, ainda em agosto de 2021, pelo Comitê Gestor, do Portal Nacional  Contratações Públicas (PNCP) previsto no art. 174 da Lei 14.133  (https://pncp.gov.br/). 

O objetivo do PNCP é garantir máxima transparências para as  contratações públicas, concentrando toda a informação pertinente, a todo  cidadão, em tempo real e desde qualquer lugar.

Sobre o tema, vale a leitura do artigo publicado por FERNÃO JUSTEN  DE OLIVEIRA e MARIA JULIA BEZERRA CASTELO BRANCO na edição nº  174 (agosto/2021) deste Informativo Eletrônico (acesse aqui).

5. A regulamentação sobre o procedimento da licitação eletrônica por  critério de maior preço ou maior desconto

 Por fim, outro marco fundamental sobreveio com a edição, no final de  setembro de 2022, pela Secretaria de Gestão do Ministério da Economia, da  Instrução Normativa SEGES/ME n° 73/2022, para regulamentação do procedimento da licitação eletrônica pelos critérios de julgamento de maior  preço ou maior desconto.

Por meio dessa Instrução Normativa, que entra em vigor no dia 1º de novembro de 2022, os entes e órgãos da Administração Pública federal  poderão realizar certames eletrônicos com base no critério de menor dispêndio para contratação de bens, serviços e obras, especialmente na modalidade de pregão eletrônico, que concentra a maior parte das licitações públicas  atualmente.

 Um resumo preciso das novidades contidas nessa importante  regulamentação pode ser conferido no artigo elaborado por MARÇAL JUSTEN  NETO, publicado nesta edição n.º 188 (outubro/2022) do Informativo Eletrônico  (acesse aqui).

6. A regulamentação existente até o presente momento (out./2022)  

Até outubro de 2022, contando com os dois atos normativos acima  indicados, a regulamentação da Lei 4.133/2021 abrange os seguintes normas  no âmbito federal:

Instrução Normativa SEGES/ME 67, de 8 de julho de 2021 – que  dispõe sobre a dispensa de licitação, na forma eletrônica, de que  trata a Lei 14.133, e institui o Sistema de Dispensa Eletrônica, no  âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e  fundacional.  

Decreto 10.764, de 09 de agosto de 2021 – que dispõe sobre o  Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas, de  que trata o § 1º do art. 174 da Lei 14.133.

Decreto 10.818, de 27 de setembro de 2021 – que regulamenta o  disposto no art. 20 da Lei 14.133, para estabelecer o  enquadramento dos bens de consumo adquiridos para suprir as  demandas das estruturas da administração pública federal nas  categorias de qualidade comum e de luxo. 

Decreto 10.922, de 30 de dezembro de 2021 – que dispõe sobre  a atualização dos valores estabelecidos na Lei 14.133.

Decreto 10.929, de 7 de janeiro de 2022 – que estabelece  procedimento especial o Ministério da Economia realizar  consultas públicas para edição de decretos destinados a  regulamentar dispositivo da Lei 14.133.

Decreto 10.947, de 25 de janeiro de 2022 (alterado pelo Decreto  11.137, de 18 de julho de 2022) – que regulamenta o inciso VII do  caput do art. 12 da Lei 14.133 para dispor sobre o plano de  contratações anual e instituir o Sistema de Planejamento e  Gerenciamento de Contratações no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.

Portaria PGR/MPU 85, de 27 de maio de 2022 – que regulamenta  o art. 20 da Lei 14.133 para estabelecer o enquadramento dos  bens de consumo nas categorias de qualidade comum e de luxo às contratações de bens de consumo, no âmbito Ministério  Público da União.

Instrução Normativa SEGES/ME 26, de 13 de abril de 2022 – que  dispõe sobre a dispensa, o parcelamento, a compensação e a  suspensão de cobrança de débito resultante de multa  administrativa e/ou indenizações, previstas na Lei 14.133, não  inscritas em dívida ativa. 

Instrução Normativa SEGES/ME 73, de 30 de setembro 2022 – que dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por menor  preço ou maior desconto, na forma eletrônica, para a contratação  de bens, serviços e obras, no âmbito da Administração Pública  federal direta, autárquica e fundacional. 

7. A regulamentação que falta

Até o presente momento (outubro/2022), a nova Lei não contém  disciplina legal exaustiva sobre o procedimento. A IN SEGES/ME 73/2022 foi  um importante marco, mas não resolve integralmente o problema. 

E ainda não existe ainda disciplina regulamentar da Lei 14.133 a  respeito de plano de contratações anual (art. 12, inc. VII), catálogo eletrônico  de padronização (art. 18, Inc. II e § 1º), margens de preferências para bens e  serviços nacionais (art. 26, § 2º), leilão (art. 31), custos indiretos para definição  e menor dispêndio nas licitações de julgamento pelo menor preço (art. 31, §  1º), ações de equidade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho (art.  60, inc. III), negociação de condições mais vantajosas com o primeiro colocado (art. 61, § 2º), processo eletrônico de comunicação a distância para habilitação  (art. 65, § 2º), documentos equivalentes a serem apresentados por empresas  estrangeiras (art. 70, par. único), procedimento auxiliares (art. 78, § 1º),  credenciamento (art. 79, par. único), procedimento de manifestação de  interesse (art. 81), sistemas de registro de preços (art. 82, § 5º, inc. II), registro  cadastral (art. 87), forma eletrônica para celebração e contratos (art. 91, § 3º),  modelo de gestão do contrato (art. 92, inc. XVIII), práticas de gestão de riscos e  controle preventivo das contratações (art. 169, § 1º), utilização de sistema  eletrônico fornecido por pessoa jurídica de direito privado para as licitações  públicas (art. 175, § 1º) – dentre outros temas.

Em suma: existem aproximadamente 50 disposições na Lei 14.133 a  respeito da edição regulamentos – ou seja, dezenas de regulamentos a serem  editados pela União (no exercício da competência privativa para editar normas  regulamentares gerais) e demais entes federativos (no exercício das suas respectivas competências), a fim de que a nova Lei de Licitações possa ser  integralmente aplicada. 

A ausência dessa regulamentação impede que a Administração faça  pleno uso do novo regime licitatório, gerando insegurança jurídica.

8. Regulamentação no âmbito estadual

No âmbito estadual, merecem destaque: 

Decreto Estadual 10.086, de 17 de janeiro de 2022 – que  regulamenta a Lei 14.133 no âmbito da Administração Pública  estadual, direta, autárquica e fundacional do Estado do Paraná.

Decreto Estadual 66.294, de 3 de dezembro de 2021 – que  dispõe sobre a aplicação da Lei 14.133 no âmbito da  Administração direta e autárquica do Estado de São Paulo.

Decreto Estadual 959, de 28 de maio de 2021 – que dispõe sobre  o regime de transição para a plena aplicação da Lei 14.133,  estabelecendo planejamento e instituindo Comissão Técnico Jurídica com vistas à regulamentação do novo regime de licitação  e contratação no âmbito da Administração Pública estadual direta,  autárquica e fundacional no Mato Grosso. 

Decreto Estadual 15.692, de 8 de junho de 2021 – que constitui  Grupo de Trabalho Intersetorial, para a implementação dos  procedimentos previstos na Lei 14.133 no Mato Grosso do Sul.

Decreto Estadual 47.680, de 12 de julho de 2021 – que dispõe  sobre o regime legal de licitações e contratos administrativos a  ser utilizado no âmbito da Administração Pública estadual direta,  autárquica e fundacional do Poder Executivo, e institui os comitês  executivo e técnico de governança em contratações públicas,  com vistas à regulamentação e efetiva implementação da Lei  14.133, no Rio de Janeiro. 

Decreto Estadual 4.941-R, de 6 de agosto de 2021 – que dispõe  sobre a regulamentação e a implementação da Lei 14.133 no  âmbito da Administração Pública estadual direta e indireta do  Espírito Santo, instituindo Comitê Gestor para regulamentação e  implementação da Lei. 

Decreto Estadual 1.126, de 29 de setembro de 2021 – que  regulamenta as hipóteses de contratação direta disciplinadas pela  Lei 14.133 no Mato Grosso. 

Decreto Estadual 51.651, de 27 de outubro de 2021 – que  regulamenta a Lei 14.133 em Pernambuco, no que se refere aos  agentes públicos que desempenham funções essenciais nos procedimentos de contratações públicas. 

Decreto Estadual 10.004, de 16 de dezembro de 2021 – que  dispõe sobre a criação de grupos especiais de trabalho para a  elaboração de minuta de regulamentação da Lei 14.133 em  Goiás.

Decreto Estadual 15.941, de 26 de maio de 2022 – que dispõe  sobre a fase preparatória para a aquisição de bens e a  contratação de serviços de qualquer natureza e, no que couber, para contratação de obras, no âmbito dos órgãos da  Administração Direta, das autarquias e das fundações do Poder  Executivo do Mato Grosso do Sul, nos termos da Lei 14.133.

Decreto Estadual 6.474, de 1º de julho de 2022 – que institui  Comitê Executivo e Grupo Técnico para regulamentação e efetiva  implementação da Lei 14.133 em Tocantins.