Informativo Eletrônico - Edição 218 - Abril / 2025

EVOLUÇÃO DA REMUNERAÇÃO VARIÁVEL E DOS CONTRATOS DE EFICIÊNCIA NA LEI 12.462/2011 E NA LEI 14.133/2021: PERSPECTIVA COMPARADA E IMPACTOS

Rafael Wallbach Schwind FCIArb
Pedro Henrique Savaris

1. Introdução

A evolução das normas licitatórias brasileiras trouxe mecanismos para aprimorar a eficiência dos contratos administrativos. A remuneração variável e os contratos de eficiência são dois instrumentos que buscam vincular os pagamentos à performance do contratado, estimulando maior compromisso com resultados efetivos para a Administração Pública.

A Lei 14.133/2021 (Lei Geral de Licitações) apresenta previsões para esses modelos. Antes dela, a Lei 12.462/2011, que dispunha sobre o Regime Diferenciado de Contratações (RDC) e teve os arts. 1º a 47 revogados pela Lei 14.133/2021, já tratava do assunto.

Neste artigo, pretende-se fazer uma análise das regras vigentes a respeito da remuneração variável e dos contratos de eficiência a partir da óptica da evolução ocorrida entre a Lei do RDC e a atual Lei Geral de Licitações.

2. Remuneração variável

Nas palavras do Professor Marçal Justen Filho “A contratação com remuneração variável consiste numa avença em que o particular assume a obrigação de executar prestação definida segundo parâmetros mínimos de qualidade, com a possibilidade de variação da remuneração em vista da execução de objeto dotado de atributos mais vantajosos do que os previstos originalmente”.¹

Essa remuneração adicional não deve ser vista como prejuízo ao interesse público, mas como contrapartida pelo risco assumido pelo contratado. Desde que respeitados os limites orçamentários e haja critérios objetivos, claros e relevantes previamente definidos em edital e contrato, a adoção desse regime contribui para a obtenção de resultados superiores sem comprometer a legalidade ou a eficiência da contratação.² A Lei 14.133/2021 consolida e aprofunda esse modelo no art. 144.

Vale destacar que a remuneração variável não é compatível com qualquer contrato administrativo, dependendo dos interesses administrativos a serem satisfeitos.³

2.1. As previsões da Lei 12.462/2011 (RDC)

A Lei 12.462/2011 instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) com o objetivo de promover maior eficiência nas contratações e obter resultados mais vantajosos para a Administração Pública. Nesse contexto, o art. 10 introduziu a possibilidade de remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado. 

A remuneração variável permite o pagamento de valores adicionais caso sejam atingidos metas e padrões de qualidade definidos previamente no edital e no contrato, configurando uma lógica similar à das sanções premiais.⁴

Trata-se de uma sistemática contratual baseada no risco, em que a remuneração adicional só é devida se os resultados previamente estabelecidos para este fim forem efetivamente alcançados. A adoção dessa modalidade exige motivação expressa, critérios objetivos bem definidos e observância dos limites orçamentários estabelecidos, reafirmando o compromisso com a responsabilidade fiscal.

No entanto, apesar da flexibilidade do RDC, o regime não exigia à época a apresentação de uma matriz de riscos detalhada nem previa critérios uniformes para medir o impacto econômico da remuneração variável, o que poderia gerar insegurança jurídica na sua aplicação prática. Ainda assim, a inovação representou um avanço ao admitir mecanismos que premiam o desempenho acima do mínimo exigido, como práticas sustentáveis e antecipação de entregas.⁵

2.2. As previsões da Lei 14.133/2021

A Lei 14.133/2021 ampliou e estruturou o uso da remuneração variável, autorizando sua aplicação em contratos de obras, serviços e fornecimentos, inclusive de engenharia, desde que prevista no edital e vinculada a metas, qualidade, sustentabilidade e prazos. Conforme Marçal Justen Filho, trata-se de um instrumento da função promocional do Direito, que recompensa desempenhos superiores ao mínimo exigido, desde que gerem benefícios concretos à Administração.⁶

Esse modelo configura um pacto complementar, no qual o contratado cumpre o mínimo previsto, mas pode receber remuneração adicional ao superar padrões estabelecidos. A lógica combina obrigações de meio e de resultado, operando como sanção positiva, ao incentivar condutas desejáveis por meio de prêmios, e não de punições.

Em síntese, a remuneração variável torna-se ferramenta relevante de gestão pública orientada à eficiência, inovação e excelência contratual.

3. Contratos de eficiência

Os contratos de eficiência são uma modalidade contratual voltada à redução de despesas da Administração Pública por meio de medidas de racionalização e inovação. 

O contratado é remunerado com base na economia efetivamente gerada, assumindo o risco do insucesso. Trata-se, assim, de uma contratação por resultado, que exige planejamento, parâmetros comparativos e critérios objetivos para mensurar a economia obtida.

3.1. Previsões da Lei 12.462/2011 (RDC)

Os contratos de eficiência, previstos no art. 23 da Lei 12.462/2011 (RDC), consistiam em instrumentos contratuais nos quais o particular assumia a obrigação de gerar economia nas despesas correntes da Administração Pública, sendo sua remuneração vinculada a um percentual da economia efetivamente obtida. Diferenciavam-se da remuneração variável do art. 10 da mesma lei, pois nos contratos de eficiência o cumprimento da meta de economia constituía obrigação contratual: o não atingimento podia resultar em desconto, multa ou sanção por inexecução. A proposta do contratado deveria incluir plano de trabalho e preço, sendo o critério de julgamento o maior retorno econômico, obtido da combinação entre o valor economizado e o percentual de remuneração oferecido.

A lei exigia a definição clara da despesa corrente de referência para cálculo da economia gerada e admitia a adoção de escalas percentuais progressivas, premiando desempenhos superiores. Ainda que o dispositivo legal seja genérico quanto ao momento de aferição da economia, recomenda-se que edital e contrato o definam expressamente. O contrato de eficiência deveria sempre respeitar a legalidade e a moralidade administrativa, vedando propostas que, embora econômicas, fossem baseadas em práticas irregulares. Em caso de descumprimento, o contratado poderia sofrer sanções que variavam conforme o grau de diferença entre a economia prometida e a efetivamente obtida.

3.2. Previsões da Lei 14.133/2021

A Lei 14.133/2021 reafirma e amplia a aplicação dos contratos de eficiência, tratando deles em dispositivos como os arts. 6º, LIII, 39, e 110. Trata-se de contrato bilateral com obrigação de resultado e no qual o contratado deve gerar economia real para a Administração, comportando a remuneração variável inclusive.

A lei exige parâmetros objetivos de mensuração e metas mínimas de economia, com previsão de sanções em caso de descumprimento. Os prazos variam de até 10 anos (sem investimento) a 35 anos (com benfeitorias permanentes). 

A Lei 14.133/2021 ainda introduz mecanismos como o critério do maior retorno econômico e a matriz de riscos, reforçando a segurança jurídica e o foco em resultados. Nos contratos de eficiência, por exemplo, o pagamento está atrelado à economia gerada, com previsão de sanções se as metas não forem atingidas.

A IN SEGES/ME nº 96/2022 detalha regras sobre propostas, julgamento e forma eletrônica. Em 2023, o ICS – Instituto Curitiba de Saúde realizou a primeira licitação com esse modelo, obtendo economia de 11,33% com a implantação de uma usina solar.⁷

4. Comparação entre os Modelos da Lei 12.462/2011 e da Lei 14.133/2021

Embora tanto o RDC quanto a Lei 14.133/2021 adotem lógica de remuneração similar, a principal distinção reside na maior abrangência e regulamentação trazida pela Lei 14.133/2021. Diferente do RDC, que tratava a remuneração variável como incentivo, a nova legislação confere estrutura mais robusta, com definição de conceitos, critérios objetivos de julgamento, prazos específicos e vinculação à matriz de riscos.

Exige-se, ainda, que o pagamento esteja condicionado à efetiva redução de custos ou à obtenção de ganhos mensuráveis para a Administração. Com isso, os contratos de eficiência se consolidam como instrumentos centrais de uma gestão pública orientada a resultados. 

A tabela a seguir sintetiza as principais diferenças entre os dois regimes:

Remuneração VariávelContratos de Eficiência
CritérioRDC (Lei 12.462/2011) NLL (Lei 14.133/2021)RDC (Lei 12.462/2011)NLL (Lei 14.133/2021)
Base LegalArt. 10Art. 144Art. 23Art. 39
ObjetivoIncentivar desempenho do contratadoVincular remuneração a metas de qualidade e economiaReduzir despesas da AdministraçãoReduzir despesas e otimizar gastos públicos
AplicabilidadeObras e serviços no RDCQualquer contrato público com critérios de desempenhoQualquer contratação com obrigação de economia realExclusivo para contratos com metas de economia mensuráveis
Forma de PagamentoBonificação ou penalização conforme desempenhoPremiação ou penalização baseada em metasPercentual da economia obtidaPercentual da economia obtida
Critérios de AvaliaçãoEficiência, qualidade e produtividadeEficiência, qualidade e produtividade, vinculados a métricas objetivasRedução mensurável de custos operacionaisRedução mensurável de custos, com critérios mais detalhados e transparência jurídica
RegulamentaçãoMenos detalhada, deixando a definição a cargo do contratoMais detalhada, exigindo previsão explícita em edital e contratoGeral, sem critérios rígidosRegulamentação específica na IN SEGES/ME 96/2022

5. Considerações Finais

A Lei 14.133/2021 aprimorou os mecanismos de incentivo à eficiência, tornando mais atrativa a adoção de modelos contratuais que promovam melhores resultados para a Administração Pública. Tanto a remuneração variável quanto os contratos de eficiência são ferramentas que permitem a aplicação de uma lógica voltada mais diretamente à eficiência. Espera-se que tais figuras sejam utilizadas com mais frequência à luz da nova legislação.

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¹ JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas. São Paulo: Revista dos Tribunais/Thomson Reuters, 2023, p. 1568

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² SCHWIND, Rafael Wallbach. Remuneração variável e contratos de eficiência no regime diferenciado de contratações públicas (Lei 12.462/2011). Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n. 56, out. 2011. Disponível em: https://justen.com.br/edicao-56-outubro-2011/

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³ JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas. São Paulo: Revista dos Tribunais/Thomson Reuters, 2023, p. 1576.

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SCHWIND, Rafael Wallbach. Remuneração variável e contratos de eficiência no regime diferenciado de contratações públicas (Lei 12.462/2011). Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n. 56, out. 2011. Disponível em: https://justen.com.br/edicao-56-outubro-2011/

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SCHWIND, Rafael Wallbach. Remuneração variável e contratos de eficiência no regime diferenciado de contratações públicas (Lei 12.462/2011). Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n. 56, out. 2011. Disponível em: https://justen.com.br/edicao-56-outubro-2011/

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JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas. São Paulo: Revista dos Tribunais/Thomson Reuters, 2023, p. 1570.

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JBOLOGNESI, João Antonio Luz. A primeira licitação pelo critério de maior retorno econômico pela nova Lei de Licitações (Lei 14.133/21). Informativo Eletrônico, Edição 196, junho de 2023. Disponível em: https://justen.com.br/artigo_pdf_1_est/a-primeira-licitacao-pelo-criterio-de-maior-retorno-economico-pela-nova-lei-de-licitacoes-lei-14-133-21/. Acesso em: 28 mar. 2025.

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Rafael Wallbach Schwind
Rafael Wallbach Schwind FCIArb
Doutor e Mestre em Direito do Estado pela USP. Sócio da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Pedro Henrique Savaris
Pedro Henrique Savaris
Acadêmico de Direito da PUC/PR. Estagiário da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Rafael Wallbach Schwind
Rafael Wallbach Schwind FCIArb
Doutor e Mestre em Direito do Estado pela USP. Sócio da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
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Acadêmico de Direito da PUC/PR. Estagiário da Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
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